Crise e felicidade

Todas as coisas estão sujeitas a mudanças, são impertinentes, como afirmam os budistas. Também o sucesso, as vitórias e os ganhos. Por isso, convém cair e fracassar de vez em quando, desenvolver um pouco o músculo da frustração; é importante saber escorregar dignamente na impotência e na humildade, e sentir os limites e a tristeza, o aroma úmido do humano. Os inevitáveis obstáculos do caminho nos tornam fortes e mais reais; de vez em quando precisamos de lágrimas para manter lubrificadas as dobradiças de nossa fragilidade e abertura emocional, e de nossa proximidade com os outros.

Portanto, acho que é uma aposta arriscada demais fazer a alegria depender de as coisas serem de determinada maneira – uma maneira que, para a maioria das pessoas, tem a ver com o ganhar. Acho uma aposta melhor preparar-se, e preparar também os filhos, para dispor dos recursos que permitam enfrentar os dissabores, as adversidades, as inclemências, as perdas e os desafios, e saber lutar e se esforçar, quando for necessário, para desenvolver a excelência (a virtude, também poderíamos dizer) naquilo que fizermos e vivermos, e também a verdadeira humanidade quando atravessarmos as portas da retração. Em minha experiência profissional e de vida vi que algumas pessoas encontram e mostram seu lado mais colorido, comovente, genuíno e vital exatamente quando parece que não conseguem governar sua nave como sempre fizeram, surge outra humanidade, outra necessidade dos outros e outra medida da existência e do que tem valor.

Algumas crises operam como se tivessem um presente implícito, liberando as pessoas de suas rançosas imagens interiores acerca de quem são, e de suas imagens de que as coisas deveriam ser de determinada maneira. Carregam em si e exigem o desenvolvimento de uma atitude de permissão, aceitação e concordância com o que é.

Joan Garriga Bacardí

trecho extraído do livro “A chave para uma boa vida” (Academia)

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